Um dos avanços mais promissores na oncologia é a biópsia líquida, um exame capaz de detectar fragmentos de DNA tumoral circulando no sangue, mesmo quando exames de imagem já não mostram mais sinais da doença. Essa tecnologia tem revolucionado a forma como monitoramos o câncer após a cirurgia, ao permitir a identificação da chamada doença residual mínima. Ou seja, células microscópicas que podem originar metástases no futuro.
No Congresso Americano de Oncologia deste ano (ASCO 2025), um estudo australiano com 961 pacientes operados por câncer colorretal trouxe evidências robustas sobre o tema. Os pesquisadores identificaram DNA tumoral circulante (ctDNA) em 257 desses pacientes, indicando que, apesar da remoção do tumor, ainda havia sinais de doença no organismo. A quantidade desses fragmentos também foi determinante: quanto maior o nível de ctDNA no sangue, maior o risco de recidiva da doença.
O estudo também avaliou a intensificação do tratamento com base nos níveis de ctDNA. Embora, neste caso, a intensificação não tenha trazido benefício significativo, os dados apontam para um futuro em que decisões sobre quimioterapia poderão ser mais personalizadas. Pacientes sem sinais de DNA tumoral no sangue poderão, possivelmente, evitar tratamentos adicionais, poupando efeitos colaterais e custos, enquanto aqueles com ctDNA elevado poderão receber terapias mais direcionadas.
A biópsia líquida, portanto, representa uma mudança de paradigma: em vez de esperar que o câncer volte a se manifestar, os médicos poderão agir preventivamente, guiados por marcadores biológicos sensíveis. E mais: por ser um exame simples, feito a partir de uma amostra de sangue, tem potencial para ser amplamente utilizado no acompanhamento de diferentes tipos de tumor.
Mais do que uma ferramenta de precisão, a biópsia líquida simboliza uma medicina que caminha rumo ao cuidado mais inteligente, individualizado e humano. O futuro do controle do câncer pode, literalmente, estar correndo em nossas veias.
*Dr. Fernando Maluf é médico oncologista, cofundador do Instituto Vencer o Câncer e professor livre-docente da Faculdade de Medicina da Santa Casa de São Paulo.