O cenário mundial encontra-se confuso. Nublado por demais, e que se estende por todos os povos. E isso tem levado a desentendimentos. Desentendem-se os líderes, e ao desentenderem, levam as populações a bater cabeças. Batem cabeças não apenas por conta da pandemia, que continua infectando e matando pessoas, mas também em função da invasão russa em terras ucranianas. Invasão em um ponto específico do globo terrestre, porém suas consequências se estilhaçam, e respingam para todos os quadrantes. O mercado enlouquece. Ou finge-se enlouquecer. Justamente no instante em que alguém, supostamente, por descuido, tivesse apertado à tecla errada no grande computador da vida, cujo efeito foi bem outro, bastante diferente do que se desejava ter. Suponha que seja assim o funcionamento. Nem todos, contudo, tem acesso a esse computador, mesmo que tenha Internet, mais ou menos potente. Não ter acesso, por outro lado, poderia livrá-lo de uma série de dissabores. Afinal, não tomaria conhecimento do que acontece mundo afora. Mas, volta e meia, um vizinho comenta tal coisa, outro acrescenta mais detalhe ao que foi dito, e, então, quem nada sabia, passa a estar por dentro, ainda que muito superficial. E, ao ficar por dentro, mesmo superficialmente, ele se depara com a triste realidade, e sente bastante por conta disso.
Isto, porém, não o faz deixar o interior da caverna. Este feito, o de deixar o fundo da caverna, carece de visão própria, de posicionamento mais arrojado, o qual o leva a escalar as paredes, e, desse modo, chegar ao topo, onde, por fim, saltaria para fora. Seus olhos se tornariam embaçados, até por conta da forte luz solar, e esta não é outra coisa senão a luminosidade da realidade. Realidade em que não estava acostumado, pois, lá no fundo, tinha as sombras, que passavam pelas frestas da caverna, e lhe apresentavam como verdades, porém carregadas de alterações a mando do Grande Irmão, e realizadas por Winston Smith, do livro “1984”, de George Orwel. Ao sair-se para fora, depara com a verdadeira realidade, que está longe, muito longe de ser singular. Sempre plural. Pluralidade que tanto, mais tanto o Grande Irmão procurou desqualifica-la, escondê-la, assim como fizeram, e farão todas as ditaduras, sempre sob o escudo do “patriotismo”, sob a cantilena do discurso único. Subtraindo, assim, a liberdade, ainda que venham a dizer que a defenda, e o faz supostamente em nome de terceiros.
Há muitos Winston Smith por aí. Igualmente existem patrocinadores de araque da liberdade. Seus disfarces os revelam. Mas, para revela-los, carece se livrar da miopia. Miopia não de nascença, e mesmo se de nascença fosse, poderia ser extirpada, desde que se tenha com clareza o papel de cidadão, cuja característica primeira é a de questionar, analisar e avaliar o que se vê, ou lê, ou o que se ouviu, e, em seguida, o de se posicionar diante do visto, lido ou do ouvido. Todo posicionar-se é político. O apolítico, neste caso, desaparece. Posicionando-se, opina-se a respeito, atividade que exige, antes de qualquer coisa, conhecimento. Só se conhece aquilo que se debruça sobre, e, ao debruçar-se, maneira de se dizer, escapa de todo o fardo ilusionista de que tentaram te passar. Vem daí o ser crítico. A criticidade é necessária. Imprescindível em toda a situação. Ainda que se tenham pela frente nuvens escuras, artificiais ou não, ou em uma sinuca de bico. Sair-se desta, ou daquela, é uma proeza, e esta se torna mais expressiva quando se vale de toda a técnica da esgrima. Esgrima necessária para se esvair das teias da retórica, da ilusão discursiva e até mesmo das armadilhas do tão falado mercado. Mercado que se encontra em ebulição, até por conta da pandemia e da invasão russa, cujas consequências se revelam também no aumento do dólar, do petróleo e de insumos, o que faz elevar o preço dos produtos de primeira necessidade. É isso.
Lourembergue Alves é professor universitário e analista político.