Não é fácil o lidar com as coisas da política-eleitoral, tampouco o é com as da político-partidária. Muito menos deveria sê-lo, uma vez que cada uma de tais coisas vem carregada de interesses particulares, individuais e grupais. Preponderantes e soberanos. Interesses que, nem sempre, se apresentam com tanta clareza aos olhos da maioria da população, a exemplo das águas que brotam do nascedouro, e, logo, põem-se a escorrer espremidas em meio a pedras, até alcançarem maior liberdade de vazão, com o leito mais alargado. Embora lá na frente possam ficar, e ficam mesmo sujeitos aos dejetos, que lhes retiram toda a claridade do sol. Falta de claridade também no jogo político-eleitoral, cujos atores “vendem”, ou tentam “vender” seus desejos como se os fossem de toda a população. E os fazem, ou tentam fazê-los com bastante maestria. Tanto que conseguem atrair uma porção de gente, tornando-as suas seguidoras, e por vezes bem mais que discípulas. E, nesta condição, perdem o sentido da reflexão, o poder da racionalidade e a capacidade de criticidade. Tronando-se, por inteiras, torcedoras. Torcem, e lacram os que se atrevem a apontar os erros cometidos pelos seus agentes políticos de estimação. Estes, no entender daqueles, são perfeitos, e colocados acima de quaisquer suspeitas, além de terem sempre razão, exemplos de vida pública, social e religiosa. Tidos como santificados, sem que tivesse passado por qualquer teste iniciático, afinal, a pia batismal, tornou-os cheios de “virtudes heroicas”, “beatificação” e “canonização”.
Situação que não pode ser questionada, contestada muito menos, até porque quem ousa questionar e contestar sofre com a lacração. Lacração aumentada em ano eleitoral, enquanto as versões são colocadas sobre a mesa, aparecem na campanha, componentes dos discursos. Discursos repetidos. Repetem-nos com demasia ou exaustão, tanto que até balança o eleitor com o voto definido, seduz o indeciso, pois produz um cenário ilusório, distante do vivido, porém recheado de magia, com tamanho poder de persuasão. É neste instante, em um processo de metamorfose, que o interesse particular se torna o interesse de todos, da coletividade. Vende-o como se fosse de fato o interesse da coletividade. Compra-o por conta disso. Estabelece, assim, um grande mercado. Mercado da política. Explora-se o emocional. Ainda que haja, e tem quem discorda, sem razão, de que a eleição é tocada pelo emocional, pois sempre há uma escolha – dizem, sem estar a si próprio convencido do predomínio da racionalidade nesse processo de escolha. Mesmo que venha a bater o pé em sentido contrário. Talvez, levado pelo jogo de nuvens que embaça seus olhos, embaralhando a visão, incapaz de ver o óbvio. Aliás, Francisco Duarte Júnior, em seu livro “o que é realidade”, afirma que o óbvio não é visto ou percebido por todos. Verdade verdadeira. Necessário se faz realça-la. Bem mais quando se sabe que no jogo político-eleitoral a verdade fica sempre no porão, escondida ao fundo, presa as correntes da ignorância. Protagonista mesmo é a mentira. Não é a primeira vez que se diz isso aqui. Tampouco esta coluna criou tal assertiva. Ela já fora dita por vários estudiosos, e um deles Hannah Arendt. O outro, Maquiavel, que fala que o príncipe deve recorrer à força do leão e à astúcia da raposa. Neste caso, não se tem dúvida, prevalece à inverdade. Inverdade contada, cujo enredo e sonoridade atraem, seduz e forma legião de torcedores. O que obriga o eleitor a ficar bastante atento. Não apenas o estudioso do jogo político-eleitoral. É isto.
Lourembergue Alves é professor universitário e analista político.